Dizem que uma pessoa que se aproxima da morte pode ver tudo o que viveu em um minuto, como se estivesse assistindo a um filme. Embora eu ainda não tenha (graças a Deus!) passado por esta experiência, sinto-me como se estivesse vivendo algo bem parecido. Minha caminhada em direção à sala do Alceu assemelha-se à de um condenado que trafega pelo corredor da morte. Obviamente o Alceu não estará em sua sala com uma foice mortal nas mãos, nem tampouco ligará o interruptor para que a cadeira elétrica derreta meus miolos (bom, pelo menos eu espero que não...), mas o desespero que toma conta de mim neste momento é ímpar. Penso que se eu perder o meu emprego aqui na usina, terei que abandonar a faculdade, pois não terei como pagar as mensalidades. O carro, então, nem se fala! Eu bem que pedi ao papai para que ele tivesse paciência e não trocasse meu carro agora. Mas não! Mal completei o período de experiência e lá estava o papai trocando o meu carro. A intenção do papai foi boa, mas achei que ele forçou um pouco a barra ao financiar R$2.500,00 para que eu pagasse mensalmente R$300,00 dos meus R$450,00 que recebo de salário. A cada passo de minha caminhada, sinto que minha passagem pelo almoxarifado da usina está chegando ao fim. “Caramba! Por que é que eu não imprimi aquela CI? O Edvaldo com certeza teria me ajudado! Mas por que foi ele faltar justamente naquele dia? E por que é que o Jaime teve que ir embora naquela tarde?” Pensar nessas coincidências me deixam cada vez mais apreensivo. Mas de nada adianta chorar o leite derramado. A verdade é que eu me sento como um boi em direção ao abate, e o Alceu é o matador, prestes a golpear meu crânio com uma enorme marreta de aço... Após uma caminhada lenta e longa, avisto a porta verde de madeirite, com os dizeres: “Alceu Gonçalves – Gerente da Divisão Agrícola” “É, agora já era. Seja o que Deus quiser!” Sem bater, giro a maçaneta da porta e adentro a sala. “Com licença, Alceu.”, digo, tentando simular um ar de segurança. Como de costume, ele responde de forma bem direta: “Fala, Antônio. Qual é o problema?”, diz ele, já olhando para a nota. “Deus do céu! Ele já notou!”. Sinto-me gelado. “Ah, que se dane!”, penso. “Alceu, essa nota aqui... A gente precisa devolver esta peça. Aqui está a C.I. pra você assinar. Sem ela o Natal não emite a nota de devolução.” Ele então lê a C.I. atentamente. Passa os olhos de cima a baixo. Em seguida, fixa os olhos na nota. “Pronto! Eu já era!”. Ele então levanta os olhos em minha direção. Os poucos segundos que se seguem parecem uma eternidade! “É o seguinte...”, diz ele, já com expressão séria. “Deus do céu! Ele lembrou! Agora vai detonar comigo!”. Mas para minha surpresa... “A nota que você precisa anexar aqui tem que ser a primeira via, e não a segunda. Vou assinar, mas você vê se vai lá no setor contábil e consegue a primeira via!”. Aliviado, eu respiro fundo. “Pode deixar, Alceu. Vou providenciar isso agora mesmo!”. Dou meia volta e sigo em direção a porta. Ao fechá-la, sinto vontade de sair gritando de alegria. Pois é... Às vezes não perder também pode ser uma grande vitória...
domingo, 10 de fevereiro de 2008
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