Outubro de 1999. 9h20min. Não há ninguém que me conheça neste lugar, pelo menos não que eu saiba. Da mesma forma, todos os rostos me surgem pela primeira vez. Sou um desconhecido, todos são desconhecidos para mim. No entanto, tenho a impressão de que alguém acabou de tocar meu ombro e, ao fazê-lo, chamou-me pelo nome. Por uma fração de segundos, sinto vontade rir. “Deve ter sido miragem. Ninguém me conhece neste deserto”. Por via das dúvidas, decido virar-me. Para minha surpresa, há alguém atrás de mim, que ao me ver girando o pescoço, puxa um outro tamborete e se coloca sentada à minha frente, próxima à bancada. Aquela mulher magra, de pele branca e cabelos castanhos claros, aparentando uns 28 anos, esboça um sorriso cordial e estende sua mão direita em minha direção. “Muito prazer. Meu nome é Ana Cláudia”. Sem que eu nada perguntasse, aquela então desconhecida começa a explicar-me que é amiga do Wilson e do “Norba”, os professores de graduação que mais me incentivaram a ingressar na pós-graduação. Ela me conta que eles foram colegas de laboratório e, de quebra, narra alguns acontecimentos engraçados envolvendo os dois. Eu rio das coisas engraçadas que ela me conta. Como minhas risadas não são o ponto forte de minha discrição, percebo que as demais pessoas daquele lugar começam a rir do meu jeito e do meu sotaque “caipiras”. “O Wilson me disse que você viria. Conte comigo para o que precisar.” Enfim, há alguém com quem eu possa contar. “Obrigado Ana”. De repente, um lampejo. “Peraí, você é a Aninha?” Ela sorri. “Sim, é assim que o Wilson e os amigos me chamam.” Recordo-me então dos elogios que o Wilson tecia à sua capacidade intelectual, competência e bondade. Levanto as sobrancelhas, demonstrando surpresa. “Muito prazer, Aninha”, digo, oferecendo-lhe a mão novamente. Ela acha engraçado. “Desde já lhe agradeço. Pode ter certeza de que eu vou precisar muuuuito da sua ajuda”. 9h40min. A Ana se levanta do tamborete. “Venha, vou lhe apresentar os seus colegas de laboratório. Fica evidente que ela se dá bem com todos. Vejo, pelo olhar de cada um deles, que a Ana é muito querida. “O nome dele é Miller. Ele é aluno de mestrado do prof. João”, diz a eles minha nova amiga. “Esta é a Ana Cláudia. Para não confundir nós duas, chame-me de Aninha e a ela de Kaká”. Pela estatura da Kaka, dá pra entender porque usaram o diminutivo no apelido “Aninha”. Não, certamente não vou confundir. Rute, Marcos Salvador, Eliane, Elisandra, Andréia, Renatinha, Sakamoto, Cristiane Jordão, Cristiane Grael, Cléber, Fabiana, Augusto. É claro que em um primeiro momento, não conseguirei associar esses nomes a cada uma das pessoas. Mas agora todos sabem meu nome, e eu sei que posso contar com pelo menos uma delas: a “Aninha”. 9h50min. Após ser apresentado aos colegas, chamo a “Aninha” até a minha bancada. Sento em meu tamborete e ofereço-lhe um outro a ela. Ela se senta, curiosa. Pego então o papel em que o professor João havia desenhado todos aqueles esquemas e mostro a ela. “Ana, o prof. João disse-me que é pra eu fazer isso aí. Você sabe o que é? Você pode me ajudar?”. Ela pega o papel, faz uma cara de preocupada, depois balança a cabeça em sinal negativo, sorri e me devolve o papel. "O que você quer dizer com esse sorriso?"
(to be continued...)
(to be continued...)